Um olhar certeiro e um sorriso de canto de boca. Uma prece muda quando se vão todas as roupas. Um iminente perigo e um assunto perdido. O que acontece com a gente quando a gente não deixa nada acontecer?
Outro dia falei sobre o meu cansaço ósseo, recorda-se? Aquela exaustão profunda, mas perfeita. A sensação que me retesa, mas que é estranhamente profícua. Ainda está me acompanhando? Espero que não, mas torço para que sim. Não sei direito aonde vou, mas eu me sentiria melhor se fosse bem acompanhado. Você vê quão rápida é a vida de um inseto? A morte não faz distinção entre santos e abjetos. Nota como o mundo rasga sonhos como um escritor rasga um pedaço de papel? Ninguém por aqui pensa nas árvores e ninguém pensa no mundo. Honestamente seria capaz de odiar a todos, acaso pensassem em trivialidades nestes raros momentos de importância identificável. Qual é o problema?
O
meu problema é que sou horrível em querer o que quero querer. Quando devo falar
o meu silêncio pesa indizível. Quando falo, eu sinto que era melhor me abster.
Canso-me das opiniões
alheias tão sem fundamentos e tão repletas de preconceitos. Sinto-me em
lassidão e não sei se estou despencando ou se meu corpo jaz colado ao chão. O
que sei não interessa a quem sabe significar o que vale a pena interessar.
Todos opinam tanto que sinto um profundo vazio existencial. Um arrepio
atravessa minha espinha e repouso a mão na ponta do coração, bem no impulso
apical. Chame-me de Ictus Cordis ou
de qualquer outra coisa, mas quando decidir meu nome, por favor, nunca se
esqueça. O clima é propício e todos os tolos, inclusive eu, tentam dizer ou
calar coisas. A inversão é desastrosamente comum. Geralmente falamos muito
quando a situação pede silêncio e silenciamos quando devemos nos mostrar. Como
falar da maneira correta se nada jamais permanece no lugar? Como dar conforto a
quem nunca conheceu um lar? Como se manter sensato e saudável com tantas coisas
ruins sendo feitas? Como afastar os monstros tão temíveis que jazem à espreita?
Diálogos díspares. Um
discursa sobre o universo enquanto o outro resume a vida na apoteose brega de
um verso. Um fala muito e outro escuta tanto. Este acha que o primeiro quer ser
temido, mas é crescente o encanto.
- Quando foi que mudamos de assunto? Falávamos sobre o que mesmo?
É sobre tudo e é sobre
nada também. É sobre praticidade e sobre qualquer outra coisa com qualquer
outro nome. É sobre um cansaço inexplicável que me atinge quando deveria estar
repleto de energia e sobre a energia inexplicável que sinto quando deveria
estar exausto e faço poesia. É sobre crer (quase)
sozinho em coisas frágeis. É sobre um herói sem poder que salva mais vidas do
que você jamais imaginaria. É sobre acreditar no que te faz ser quem você é e
ser exatamente isso com a convicção de que isso leve além. É sobre
fazer cursos improváveis que valorizem suas singularidades e sobre sonhos
impossíveis que talvez nem devessem existir. É sobre quartos bagunçados e corações arrumados. Sobre existencialismo, excentricidades e histórias. É sobre conquistar o mundo e sobre
fracassar. É sobre amálgamas discretas e poderosíssimas retidas em contos desacreditados e também sobre lágrimas
que abrangem Tudo. É sobre o rosto que eu tinha antes da criação do Universo e
ainda sobre o resumo que faço da vida na apoteose absurda de um verso. É, enfim, sobre fragmentos de memórias, essências e almas. É sobre amizades novas de outros continentes e outras vidas. Acima de tudo é sobre bons
momentos, amor e felicidade. É sobre não ser ilha isolada, sobre as partes que nos formam. É sobre
aprimoramento, construção e alegria. Perco-me novamente no que gostaria de dizer, mas entre tantos
embaraços, eu tropeço, entretanto, sou duro como o aço e naturalmente formo laços: sei o que fazer. Sei
que nem toda palavra rima, mas cri que minha esquecida sina é o que me traz prazer. Perdi-me noutra esquina vagando na madrugada. Cuidado por onde vira, pois essa é a hora dos fantasmas. Peguei-me rindo com a lembrança da frase: a rua é cheia de perigos. Preocupe-se quem quiser ou quem não sabe o que quer. Eu dirijo para achar o assunto perdido.